4 de março de 2020 escrito por: Marcia Regina Nunes de Souza
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4 horas da madrugada. Cheguei em Santana do Livramento/RS. Ponto do fim do mundo. Todos desceram. Um frio, um frio, um frio, um frio. O tal minuano. Breu absoluto.
Isso foi em 1989/1990. Eu estava formada há uns 5 anos.
A rodoviária era ricamente composta de um guichê de venda de passagem, fechado àquela hora e de dois bancos de madeira. Toda aberta. Nem cachorro tinha. Só o zuim zuim do vento. Puxei o capuz do casaco e me ajeitei. As 6hs. eu ia procurar uma panificadora e fazer hora até as 8hs, horário do fórum. Passam-se uns 10 minutos, volta um senhor que eu tinha visto no ônibus; alto, encorpado, sobretudo, luvas, chapéu e uma pasta de couro na mão.
– A moça vai ficar aqui?
– Vou, sim, senhor, até umas seis … e repeti a história.
– Ainda tem duas horas de espera. Você não pode ficar aqui, está menos de 10 graus.
Ele me olhava sério. Repreensão, mau humor e preocupação. Olha no relógio.
– Venha. Você fica na recepção do hotel em que eu estou.
Fui.
Começamos a andar. O único barulho na rua era o clap clap dos sapatos e o zuim zuim do vento. Um frio do demônio. A cabeça baixa pro vento não bater de frente. Firmo o capuz na capeça. Tudo negro. Não se enxergava a ponta do sapato. Uma quadra, duas, três … o homem, mergulhado no sobretudo, não abria a boca. Mais uma quadra, mais uma, vira à direita, à esquerda, à esquerda de novo … começa a nascer o arrependimento. Um medo, um frio na barriga. E agora?
Chegamos.
Uma casa grande, sem jardim, uma placa de HOTEL e um nome alemão. Dois degraus. Apertamos a campainha. Vem um homem. Entramos.
– Boa noite, doutor. Fez boa viagem?
– Sim, obrigado. Essa moça também é advogada. Pode arrumar a sala de estar para ela? Ela vai esperar o fórum abrir.
– Claro, doutor.
Passa um tempo, vem o homem.
– Pode vir.
Passo por uma porta grande de vidro. Dou de cara com o paraíso. Uma poltrona de reclinar, uma manta e … uma lareira pequena, linda, o dourado do fogo.
Alguém sacode meu ombro.
– Moça, acorde. São quase 7 horas, o café está servido.
Café quente e bolinhos. Agradeci. Fui embora para o fórum.
Não sei o nome do homem. Se perguntei, esqueci. Nunca mais o vi.
Sou a Marcia. Advogada. Há 33 anos eu fundei meu escritório de advocacia em Curitiba, sonhando em atuar só em processos de indenização. Deu certo. De lá prá cá faço isso todo dia. Trabalho com indenização. De todos os tipos, modos e jeitos.
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